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O primeiro banco



Sobrevivi ao meu primeiro banco de medicina!

... Ok, pronto, eu admito que o banco até estava calmo, pelo menos no SO. Que foi onde eu fiquei. Com uma sala de SO única e exclusivamente para MIM! Qual andar atrás do médico, qual quê!

"Dra, o senhor da cama não sei quanto está assim assim e assado. O que é que sugere?" perguntavam as enfermeiras.
"Bom, talvez isto...?" dizia aqui a "dra" um tanto ou quanto a medo, esperando não estar a contribuir para aumentar a taxa de mortalidade do país.

Mas foi genial! Não é assim tão crítico - em precisando, sabia sempre (ou pelo menos quase sempre....) onde achar alguém com pelo menos mais um ano de experiência do que eu (ena!). E diga-se que os doentinhos que me foram entregues eram tudo menos "críticos", alguns sendo internados com suspeita de enfarte agudo do miocárdio (vulgo ataque cardíaco) sem qualquer suporte electrocardiográfico ou laboratorial (falando com o doente, ele diz-nos "bom, senti esta dor no peito, mas agora já estou bem... posso-me ir embora, Dra?").

Outro doente tinha uma erisipela. "Doente simples", pensei eu, e fui tratar de o observar para deixar tudo registado no diário clínico do SO. "Despacho este rapidinho..." - grande erro. Primeiro, tive de ouvir a história toda dele, que estava mais preocupado em dizer-me como a filha se tinha formado em direito, e o filho em engenharia, do que propriamente falar sobre as suas patologias. Depois, à observação, disse-me vezes sem conta que a perna já não estava inchada (apesar de estar o triplo da outra, com uns sinais inflamatórios pouco convidativos....). "Acha que amanhã já posso ir para casa? Mas já posso dar uns passos, não posso?"... A meio da observação, sou interrompida pela enfermeira aflita que diz que durante a noite, o doente teima em acordar e insultar tudo e todos os que o rodeiam (olha a famosacoprolália que vem nos livros!!), dizendo depois que não se lembra de nada. Ora, "o meu professor de psiquiatria avisou-me sobre estes casos!" pensei eu, enquanto fui encontrar alguém que me passasse 5 mg de haloperidol para dar ao meu doentinho "insultão"... Senti-me competente - a minha primeira prescrição com 100% de certezas! :) Ou vá, 80% de certezas, que quando finalmente encontrei um médico, a minha sugestão terapêutica saíu mais em tom de pergunta que em tom de afirmação.

Outro caso curioso, mas desta vez não minha doente, foi uma senhora já velhota que recusava tomar o comprimido que a enfermeira lhe dáva. Dizia só o fazer se fosse um médico a dar. A enfermeira foi chamar-me. A mim, com esta carinha de quem ainda nem saíu do secundário. Claro está que a doente não foi na conversa à mesma. Disse-me que não era médica (bom, nessa parte ela nem se enganou muito!), que eu tinha "cá uma lábia!", que estávamos todos ali para lhe fazer mal, que queria ir para casa, etc etc etc... Quando questionada se só os velhotes gordinhos e com barba branca é que podiam ser médicos, ela riu-se, dizendo que eu não o seria certamente. Enfim. O que nos vale é que toda esta conversa deu para que o comprimido se dissolve-se na boca. Hmmmm, será que faz efeito se for dissolvido na boca em vez de ser no estômago?....

Eu até continuava com os doentes, mas acontece que o post já vai grande.

Aqui a ideia é simplesmente: Sobrevivi ao meu primeiro banco! :)


Ah, esperem... contei-vos do doente de 80 anos que, às 23:30 da noite decidiu ir cortar as suas unhas (garras?) dos pés, já amaralecidas, com um alicate que fazia com que as unhas voassem por todo o SO? ....

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2 comments:

anacruz said...

Anita, afinal isso foi bem mais animado do que eu pensava!! Boa, estás de Parabéns!

Sandra said...

Dá gosto ler um post destes :)
é ver que 6 anos de curso são realmente capazes nos transformar :)

Estás absolutamente de parabéns :D

ps: a senhora do comprimido tinha cá uma perspicácia..vai lá vai! Em dois tempos detectou que eras uma farça! :P qual dra qual quê!